Quarta-feira, 21 de Maio de 2008

[44] Ainda sobre o Dharma (5)

 

    Resolvi publicar este post para chamar a atenção para a existência do Instituto Mind and Life. Foi fundado em 1988, para assegurar a organização regular de encontros entre o Dalai Lama e cientistas ocidentais. De resto, esses encontros já vinham tendo lugar, mas um pouco ao sabor das circunstâncias. Assim, alguns dos participantes resolveram, sempre com o acordo do Dalai Lama, criar o que começou por ser o projecto Mind and Life.

       O primeiro encontro decorreu em Outubro de 1987, em Dharamsala, na Índia (cidade onde o Dalai Lama tem residência desde que se exilou). Os resultados foram de tal forma encorajadores que se partiu para a criação do Instituto.

 

 

 

        Embora tenham sido muitas as colaborações havidas para essa criação, existem dois nomes que é indispensável pôr em realce. Um é o do americano R. Adam Engle. Ele foi o primeiro Presidente do Instituto e teve a seu cargo a complicada organização logística dos encontros. O outro é o do chileno Francisco J. Varela. Doutorado em Biologia por Harvard, especializado em neurobiologia e epistemologia, trabalhando em Paris (C.N.R.S.), coube-lhe a coordenação científica dos trabalhos. Muito conhecido nos meios científicos por causa das suas publicações e dispondo de muitos contactos em várias áreas do conhecimento, ele trabalhou afincadamente para que os encontros Mind and Life fossem um sucesso, bem demonstrado pelos livros a que deram origem. Infelizmente faleceu há pouco, precocemente.

       O nome do Instituto foi escolhido cuidadosamente para designar bem a interface, o mais frutuosa possível, entre a ciência ocidental e a tradição búdica. Dada a sua natureza, não é de espantar que os primeiros encontros recoressem sobretudo a especialistas das neurociências (o "nosso" António Damásio participou num deles) e das chamadas ciências cognitivas.  Pouco a pouco os temas foram mudando e, a partir de certa altura, além dos filósofos, dos psicólogos, dos psicanalistas, dos linguistas ou dos antropólogos, encontravam-se também especialistas em astrofísica, em cosmologia ou em física quântica. No fundo, nenhuma área é dispensável quando, como disse o Dalai Lama num dos encontros, «(...) nós não aderimos ao sentido literal das palavras de Buda quando elas são refutáveis por uma prova válida».

       Aqui convirá apontar duas precisões semânticas : a primeira é búdica, a segunda é ocidental. A búdica tem a ver com a palavra , em sânscrito, dharma. O termo é altamente polissémico : tanto significa o ensinamento (o Dharma do Buda), como o conhecimento ou a sabedoria, como ainda a via, o caminho, para os alcançar. E poderíamos continuar...

       A segunda remete para um problema relativo ao francês. Com efeito, eles não têm substantivo para o nosso mente (ou o inglês mind). O equivalente francês é esprit. Existe o adjectivo mental (que, por vezes, é substantivado), mas o que é corrente é usarem a palavra esprit. Assim não podem distinguir entre mente e espírito. O que, quando está em causa o budismo, é particularmente lastimável. Voltando a citar um Lama (que, entretanto, foi "promovido" a Rimpoché -- para quem sabe o que isto significa...) : « O budismo não é materialista nem espiritulista, é realista e experimental ».

       Completo com : no budismo não há credo, nem dogma, nem Deus.

 

 

 

publicado por Transdisciplinar às 01:39
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Quinta-feira, 10 de Abril de 2008

Fernando Gil e a psicanálise

( Do livro Mediações,  pp. 197-198 )



A psicanálise não é parente do chamanismo. (...) Como toda a empresa científica, a psicanálise é «realista», ela visa conseguir uma imagem fiel -- a expressão é de Freud -- da dinâmica de uma psique, e um efeito terapêutico. É o psicanalista quem dirige o jogo (...) e o seu método, que obedece a regras, é genético («arqueológico» e «pré-histórico»). Os contributos respectivos do analista e do paciente estão definidos. (...) As construções são obra conjunta do analista e do paciente. (...) Pode haver erros nas construções (...). O trabalho analítico deve saber conduzir à correcção do erro. (...)

A sequência da análise -- convocando, ela, o aparelho conceptual psicanalítico -- revelar-se-á o teste da justeza da construção.


publicado por Transdisciplinar às 19:48
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