Quinta-feira, 12 de Junho de 2008

[57] O protesto

 

        Estou preocupadíssimo com a situação do país. E estou indignado com muitas coisas. O protesto dos camionistas ( que me recuso a designar por greve) e as respectivas consequências nos mais variados planos da vida nacional, são de tal ordem que náo se compreende como é que o Governo se tem limitado às medidas que tem tomado e que são largamente insuficientes. Porque se chegou ao ponto de se poder falar de ruptura social. Ruptura porquê ? Porque mecanismos básicos da vida em sociedade estão postos em causa e impedem o normal funcionamento dessa mesma vida. São todos os cidadãos que , de uma ou outra forma, são atingidos pelo que se passa.

       Outros sectores sociais passam pelas mesmas dificuldades que os transportadores. Mas não dispõem como estes da capacidade de provocar a paralisação nos mais variados campos da vida social. Estes descobriram que a têm. E usam-na. Como meio de pressão. Mas com que direito ? Sempre me irritou um pouco a maneira como, à tort et à travers, se fala de Estado de direito. Mas esta é uma boa altura para lembrar a noção. E para lembrar os mais elementares direitos dos cidadãos em geral.  E para perguntar ao Governo o que tem feito nos últimos dias para assegurar "o regular funcionamento das instituições". Será que as instituições são só o aparelho do Estado ? E, mesmo este, não está posto em causa, pelo menos nas instituições a quem cumpre velar pela segurança das populações, que não se limita a não sermos assaltados na rua ? E, já que estamos nesta onda, o que nos diz o P.R. ?

       Reconheço que há grandes dificuldades. A começar pela falta de interlocutores institucionalizados e que possam ser responsabilizados pelo eventual incumprimento dos acordos a que se chegar. Por outro lado, imagino, o Governo não quer dar uma imagem de autoritarismo. Mas é aceitável que se pactue com o impedimento de liberdades, como a de circulação (ou de trabalho, para os trabalhadores que não querem aderir à paralisação -- por muito desagradável que seja a imagem dos "fura-greves") ? A verdade é que o Governo não tem sabido fazer uma boa gestão da crise.

       E as oposições -- por onde é que têm andado ? Estão à espera de quê ? Quando é que tomam posição ? Ou esfregam as mãos de contentes por o Governo se ver em apuros ?

       Estou a escrever de noite e ainda nem sei quais foram os resultados do meeting da Batalha. Talvez as coisas se tenham, de alguma forma, resolvido. Talvez a espiral de conflitualidade tenha abrandado. Esperemos que sim.

       Mas eu (que até tinha outras coisas para escrever) não fui capaz de ficar mais tempo calado sobre este assunto. Embora me não seja muito fácil pronunciar-me sobre ele, porque se configura de tal forma que é dificilmente encaixável nas categorias usuais das Ciências Políticas ou da Sociologia do Trabalho.

       Agora que já desabafei, calo-me e fico, atentamente, à espera.

publicado por Transdisciplinar às 08:40
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8 comentários:
De outraidade a 12 de Junho de 2008 às 11:55
Como entendo a sua "revolta"! Hoje vivemos numa sociedade em que os mais básicos conceitos perderam expressão. Vale tudo porque se tem o direito a tudo, chamando-se a isto democracia, Estado de direito e outras tantas asneirolas em nome da liberdade. Eu acho (modesta opinião) que todos fazem o que lhe apetece desde o governo aos governados, denotando uma total desresponsabilização. Está a ver porque é que fico com o meu sarcasmo aguçado quando se dá tanta importância (media e opositores) a coisas como a "fumaça" do Sócrates e a "raça" do Presidente?
Peço desculpa pelo meu longo comentário mas, como diz, aproveitei também para desabafar.


De Transdisciplinar a 12 de Junho de 2008 às 14:48
Fez muito bem com o seu desabafo. E fez muito bem em dizer-mo porque ao escrever o post eu não sabia que reacções iria ter. (Afinal até uma outra "amiga" me pediu para linkar o meu post .)
Um grande bem-haja.


De mdsol a 12 de Junho de 2008 às 12:36
Temos comentador! Percebo e partilho as preocupações! Vou "linkar" o seu post para o meu canteirinho. Pode ser?
:))


De Transdisciplinar a 12 de Junho de 2008 às 14:35
Com certeza que pode ser.
E não estava à espera de tanta honra...
:))


De Sofia Loureiro dos Santos a 12 de Junho de 2008 às 19:12
Subscrevo as suas palavras, Zé Carlos. Os nossos governantes, a começar no Presidente e a acabar nos defensores de algumas liberdades demitiram-se de assumir as suas responsabilidades.


De adignidadedadiferenca a 13 de Junho de 2008 às 00:05
Muitas perguntas que colocou são, obviamente, de difícil resposta. Concordo que, hoje em dia, se perdeu a noção de que se deve, acima de tudo, assumir as responsabilidades como cidadãos, sejam governantes, políticos ou meros participantes na vida social. Mas será que a culpa não é de todos nós (salvo honrosas excepções, claro)? No meu caso, por exemplo, em que sinto cada vez mais desinteresse pelos políticos e pela política que se faz no mundo - acima de tudo, por quem governa é o poder económico -, não me terei demitido demasiado cedo de algumas responsabilidades a que estava obrigado como cidadão, ao assumir um papel neutro e um tanto ou quanto cínico, para que possa merecer todos aqueles direitos que qualquer ser humano deve ter? Não sei a resposta.


De Transdisciplinar a 13 de Junho de 2008 às 00:59
Também não lha sei dar. Porque há uma grande diferença geracional entre nós. Esse deve ser o primeiro grande motivo. Mas acho que todos temos responsabilidades como cidadãos. O que não significa , de modo algum, inscrever-se num partido político. Há muitas maneiras de viver a cidadania. E, pensando nos muitos músicos de que tanto gosta, encontra múltiplos exemplos de empenhamento social e político. Não me passa pela cabeça pedir-lhe que reaja como eu. Há dias falou em tropicalismo. Ora até tem um ministro...
Francamente não sei o que lhe dizer. Precisava de o conhecer melhor para poder argumentar consigo. Mas já quer dizer alguma coisa ter reagido ao meu "Protesto" a ponto de o comentar. Pense nisso.
Um abraço.


De Sport TV a 25 de Novembro de 2010 às 00:57
Estou a ver na televisao informacao sobre a greve. O governo para o resto nunca tem números exactos, para a adesão à greve tem...


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